Dados es una de las principales publicaciones de ciencias sociales en América Latina. Creada en 1966, publica trabajos inéditos e innovadores, procedentes de investigaciones académicas, de autores brasileños y extranjeros. Editada por IESP-UERJ, tiene como objetivo conciliar el rigor científico y la excelencia académica con un énfasis en el debate público basado en el análisis de temas sustantivos en la sociedad y la política.
A revista DADOS publica seu primeiro número de 2020 em meio a um dos maiores desafios enfrentados pela ciência moderna: a pandemia de Covid-19. Colocada na defensiva por diversos movimentos anti-intelectuais, a academia desponta agora como uma das principais fontes de orientação contra a crise, não apenas por suas pesquisas médicas e bioquímicas, mas também pelo conhecimento próprio das ciências humanas. As crescentes expectativas em relação a soluções para a crise também têm aberto todo um debate sobre os procedimentos de comunicação e divulgação científicas, bem como no que toca ao lugar dos periódicos nessa dinâmica. Logo, se o momento atual parece contribuir para a renovação da legitimação pública e política da ciência, de um lado, ele também explicita alguns de seus limites, do outro.
A lentidão dos processos de avaliação editorial e o restrito alcance dos periódicos científicos são apenas dois dos pontos sensíveis em debate. Visando agilizar tais procedimentos, DADOS pretende iniciar paulatinamente a incorporação de manuscritos oriundos de servidores abertos (preprint) e a indexação das bases de dados utilizadas pelas pesquisas publicadas na revista. Ainda com o objetivo de expandir a divulgação dos nossos artigos para um público maior, investimos na política de tradução e na internacionalização, com mais de um terço dos textos deste volume sendo veiculados também em língua estrangeira, e iniciamos no Blog DADOS um espaço para contribuições mais curtas especificamente sobre as implicações políticas e sociológicas do novo coronavírus. Ao mesmo tempo, contaremos em breve com um podcast sobre alguns dos artigos publicados, forma de divulgação que se soma ao nosso tradicional press release e à presença em redes sociais como Facebook, Twitter e, agora, Instagram. Embora algumas dessas novidades já estivessem previstas desde 2019, sua adoção tornou-se ainda mais urgente.
Contudo, os esforços para agilizar a avaliação científica e expandir o alcance de suas publicações não nos devem cegar para a temporalidade própria das descobertas científicas e sua relação com problemas imediatos. O mundo da ciência não foi pego de surpresa pela pandemia justamente porque contávamos com uma relevante produção bibliográfica sobre o tema, demonstrando que urgência e imediatismo não podem ser critérios exclusivos de avaliação acadêmica. As enormes vantagens da publicação em servidores de preprints têm de ser sopesadas por algumas de suas limitações, como a divulgação de resultados de pesquisas não validados. Outro problema relativamente novo tem a ver com o decréscimo generalizado das submissões nesses servidores de artigos de autoria de mulheres, substantivamente mais atingidas que os homens por uma crise que reforça o papel delas nas tarefas de cuidado doméstico.[1] Por isso tudo, DADOS defende que as reformas nos processos de avaliação e publicação científicas devem ser combinadas aos mecanismos tradicionais consolidados, mormente a revisão por pares.
Nada mais oportuno do que reavaliar nossas rotinas científicas à luz do conhecimento consolidado, algo que marca o presente número de DADOS. Nosso primeiro artigo trata justamente da extensa e importante obra de Wanderley Guilherme dos Santos, um dos fundadores da moderna Ciência Política no Brasil e um dos principais pensadores da democracia. Wanderley também foi o fundador da pós-graduação do IESP-UERJ, ainda no antigo Iuperj, e um dos principais incentivadores da nossa revista, seja na condição de diretor do Instituto ou de seu principal colaborador. Escrito por Christian Lynch, o artigo sistematiza as premissas filosóficas e as teorias mais relevantes do autor, que infelizmente nos deixou em 2019. Destaque especial é dado para o compromisso de Wanderley com a reflexão sobre a democracia e sua defesa da pesquisa empírica teoricamente orientada.
José Alcides Figueiredo Santos, por seu turno, analisa os impactos da estrutura de classe no Brasil sobre as desigualdades de saúde de nossa população, tema que ganha enorme relevância no atual contexto. Embora a saúde das pessoas tenda a acompanhar as hierarquias da estratificação socioeconômica, um dos achados do texto destaca melhoras tímidas no nível de saúde de grupos que experimentaram importantes transições educacionais, muito embora as classes mais destituídas venham apresentando uma maior deterioração do estado de saúde por conta da proliferação de doenças crônicas.
Em uma análise de discurso automatizada de mais de 127 mil pronunciamentos parlamentares, Davi Moreira reavalia o peso da dicotomia governo-oposição na formação da agenda legislativa no Brasil. O trabalho conclui que variáveis como ideologia, gênero e popularidade do orador possuem um papel importante, para além da supracitada dicotomia. Isso busca deslocar algumas teses consolidadas na bibliografia especializada e demonstrar o potencial de técnicas de análise de conteúdo para os estudos legislativos.
Guilherme Leite Gonçalves e Sérgio Costa retomam a discussão marxista em torno da noção de acumulação primitiva, e de sua eventual repetição histórica como forma de desenvolvimento do capitalismo, a partir da incorporação de espaços e setores “fora” do capital. Com base na história violenta que marca as reformas econômicas da região portuária da cidade do Rio de Janeiro, os autores cunham a noção de “acumulação entrelaçada”. O intuito é mostrar que os processos de valorização mercantil nem sempre dependem de áreas não-capitalistas, podendo se servir também do desacoplamento e reacoplamento de setores e dimensões diversas de áreas internas ao sistema.
Maria Luisa Mendez Layera, Gabriel Otero e Vania Perret levam em conta dimensões objetivas e subjetivas para entender as variáveis determinantes do sentimento de insegurança e medo do crime na cidade de Santiago do Chile. Os modelos indicam que as variáveis subjetivas sobre o bem-estar no bairro do respondente têm maior peso explicativo, sobretudo quando consideradas as percepções de desordem física e social, além das experiências de vitimização indireta. Ao mesmo tempo, fatores como os níveis objetivos de criminalidade, concentração de renda e serviços disponíveis não parecem ser bons preditores da sensação de insegurança.
Já Thiago Oliveira, André Zanetic e Ariadne Natal buscam indicar os fatores que mais impactam nos processos de legitimação da ação policial na cidade de São Paulo. Seus modelos sugerem haver uma associação entre o reconhecimento da autoridade policial como legítima e certa propensão de obediência às leis, embora o não reconhecimento da justeza policial não possua o mesmo efeito preditor. O texto destaca, portanto, o potencial de estratégias voltadas para a ampliação da legitimidade policial em detrimento da atual ênfase das políticas de segurança pública em práticas dissuasórias.
Por fim, José Henrique Artigas de Godoy analisa a formação de uma linhagem progressista e desenvolvimentista dentro do pensamento católico brasileiro a partir das redes de relacionamento e da trajetória biográfica, intelectual e eclesiástica de Dom Helder Câmara e Louis-Joseph Lebret. A reconstrução do pensamento dos clérigos é considerada no bojo da recente revalorização da doutrina social da Igreja e a consequente retomada de princípios da Teologia da Libertação pela gestão do Papa Francisco. Tal problemática ganha novo significado no atual contexto de reavaliação da atuação papal na política global.
Com textos sobre temas diversos e vinculados a disciplinas distintas, DADOS reforça seu caráter multidisciplinar e pluritemático, sem descuidar do seu tradicional compromisso com a reflexão acadêmica sistemática e conectada a debates públicos historicamente relevantes. Assim procedendo, esperamos contribuir para o conhecimento das dinâmicas sociais e políticas, algo fundamental em tempos tão difíceis quanto o presente.
Notas
[1] Em breve, o Blog DADOS publicará resultados de uma pesquisa sobre o tema.
CAMPOS, Luiz Augusto. Nota Editorial DADOS, v.63, n.1. Blog DADOS, 2020 [published 11 May 2020]. Available from: http://dados.iesp.uerj.br/nota-editorial-2/
Etiquetas: editorial, Nova edição
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