Dados é uma das principais e mais longevas publicações nas ciências sociais no Brasil. Criada em 1966, divulga trabalhos inéditos e inovadores, oriundos de pesquisa acadêmica, de autores brasileiros e estrangeiros. Editada pelo IESP-UERJ, é seu objetivo conciliar o rigor científico e a excelência acadêmica com ênfase no debate público a partir da análise de questões substantivas da sociedade e da política.
Introdução[1]
O sistema hospitalar está colapsado no Chile. Contamos centenas de mortos por dia. A medicalização da crise levou o governo a pôr todos os recursos em fortalecer o sistema hospitalar, em vez de enfrentar a pandemia a partir da prevenção do contágio e da mitigação do impacto sobre os contagiados. O governo não comunicou a gravidade do vírus de modo coerente e sistemático e, a evidência sugere, foi alimentada a ideia de que ser contagiado não era um perigo em um país com suficientes camas e respiradores. Este mantra é repetido até hoje no discurso governamental, e tem desestimulado a ênfase em parar o contágio, apesar das advertências de cientistas e especialistas, e do que se observava em países que já se encontravam no pico de contágios, doença e morte. No Chile se incentivou, portanto, uma espécie de aceitação do contágio e uma tremenda autocomplacência de uma estratégia que uma e outra vez mostrou estar fracassando.
Terminar com o contágio no contexto chileno tomará pelo menos o dobro do tempo que o desprendido na Itália, na Espanha ou na Alemanha. Considere, por exemplo, que a Itália decretou a quarentena total em 9 de março, quando tinha 7.985 contagiados e 473 pessoas falecidas. E começou a flexibilizar suas quarentenas (fase 2) quase dois meses depois, no dia 4 de maio, sem descartar outras medidas de confinamento. O Chile, então, deveria estar pelo menos até agosto com extensas áreas em confinamento. Com a insistência em quarentenas de áreas pequenas (“dinâmicas”, a nível municipal ou submunicipal), é possível esperar que esta situação se prolongue ainda mais, já que, para que as quarentenas sejam efetivas, requerem ser aplicadas sobre cidades inteiras como mínimo.
Se o governo continuar com uma estratégia de contágio progressivo e não aceitar ajuda especializada, então a catástrofe será ainda maior. É possível que o Chile fique entre 6 e 8 meses com confinamentos, lamentando centenas de milhares de doentes, dezenas de milhares de falecimentos e com uma economia fortemente debilitada. O princípio de uma crise social violenta deve estar também em nossas mentes.
Erros do governo chileno
Um importante equívoco do governo chileno foi não prestar atenção à experiência de outros países para escolher a estratégia com maior probabilidade de sucesso local. Existem sinais que indicam que a estratégia que o governo escolheu, ainda não explicitada em um relatório oficial, foi a do referido contágio progressivo. Esta estratégia foi derrubada como um castelo de cartas. Outro erro foi o triunfalismo prematuro, uma ilusão perigosa a ser abandonada. Devemos assumir que somos como muitos outros países, com seus recursos e suas falências. É provável que para corrigir isto seja necessário mudar a equipe a cargo da pandemia no Ministério da Saúde.
Tampouco chegamos a ser, como foi dito pelo governo, o país melhor preparado. Segundo dados da OECD, o Chile está na posição 36 de 42 países em relação ao número de camas hospitalares por cada 1.000 habitantes; muito abaixo do que a Itália e a Espanha. Se comparamos o número de camas em unidades críticas (UTI, onde deveriam estar em tratamento os pacientes mais graves ou que requerem apoio ventilatório), nossas 5,3 camas por cada 100.000 habitantes, nos posicionam melhor que a Nova Zelândia e ao nível da Suécia, mas a Itália e a Espanha têm o dobro e a Alemanha sete vezes mais. Estas cifras deveriam ter significado um alerta vermelho, porque nosso sistema de saúde é, além disso, muito desigual. Por exemplo, segundo a OPS, o número de Anos de Vida Potencialmente Perdidos (AVPP) no decil de renda mais baixo é 273.9 por 1.000 habitantes (antes dos 80 anos), enquanto que a cifra é somente de 181.2 AVPP por 1.000 no decil mais alto.
Outro erro foi não ouvir a comunidade científica em sua reclamação pela falta de dados e em sua advertência de que o caminho que estávamos tomando não era o correto. O falso “achatamento da curva do contágio”, que foi comemorado em abril, foi advertido como ilusório (“COVID-19: o Chile não está achatando a curva, a perdemos de vista”). O Ministério da Secretaria Geral da Presidência simplesmente considerou que o aviso se baseava em “crenças” (ver a resposta que foi dada ao ministério). Trata-se de mais uma ocorrência do tipo de respostas que muitos grupos científicos têm recebido e que levou o Instituto Milenio Fundamentos de los Datos (IMFD), então parceiro do Ministério de Ciências, a abandonar a comissão de informação que assessorava o governo. Outro exemplo mais recente é a carta pública enviada ao presidente Piñera, assinada por 40 cientistas. A carta não recebeu uma resposta oficial apesar de que o governo prometeu implementar algumas das medidas sugeridas.
Esses erros levaram o Chile a demorar a reagir, com um custo de vidas muito alto. Apesar dos esforços por fortalecer o sistema hospitalar destes últimos meses, com um aumento significativo da quantidade de camas e de ventiladores, começamos a despertar muito tarde. Segundo a pesquisa de 10 de junho, da Sociedade Chilena de Medicina Intensiva, o Chile praticamente mais que duplicou sua oferta de camas nas UTIs desde meados de abril, chegando a 2.500 camas disponíveis nos primeiros dias de junho. Além disso, a comissão de informação do IMFD, reportou que a quantidade de ventiladores disponíveis aumentou desde 14 de abril – primeiro dia em que o dado foi noticiado – a quase o dobro, de 1.550 ventiladores a 2.876, no dia 11 de junho.
Fora de controle
Por que nos deixamos levar pelo triunfalismo e cometemos esses erros? Há algumas explicações. Os primeiros a contagiar-se foram os jovens da zona leste da capital, pessoas saudáveis e com acesso a bons serviços médicos. Essa população, obviamente, resistiu bem ao novo coronavírus, mas não refletia a realidade da maioria dos habitantes no Chile. Em retrospectiva, esse era o momento de pôr um cordão sanitário forte na zona leste e ativar sistemas para a detecção antecipada de contágios nos portos de entrada ao país. Com isso teríamos ganho tempo para preparar uma resposta nacional. Uma quarentena rígida nas comunidades com mais riqueza e acesso a recursos era possível, e teria conscientizado e elevado a percepção do risco em todo o país, porque os meios, as autoridades, e outras fontes de poder estão localizadas neste setor da população, em uma cidade fragmentada e centralista.
A ausência de planejamento eficiente de confinamento, a testagem insuficiente, o rastreio fraco e o excesso de confiança levaram o governo a pensar que estávamos achatando a curva, mas o certo é que tínhamos perdido o vírus de vista. Isto não foi constatado imediatamente porque a Covid-19 é um desastre lento, cujo impacto se percebe três semanas mais tarde, pelo menos. Todas as coisas que não foram feitas naquele momento, junto com o afã em abrir os centros comerciais e convidar a uma “nova normalidade” ou um “retorno seguro” a nossos trabalhos, incrementaram a mobilidade e reduziram o efeito da quarentena.
Hoje o Chile é um dos líderes mundiais em testagem por milhão de habitantes, mas ao mesmo tempo é o líder mundial em contágio diário e circulação do vírus. Hoje um de cada três testes é notificado como positivo (sobre 35% de positividade). A Nova Zelândia chegou, no momento de sua maior dificuldade, a notificar um de cada 25 testes como positivo. A Itália nos últimos dias de março, quando esteve mais afetada, notificou um de cada quatro a cinco testes positivos por duas semanas. Antes e depois, a Itália manteve sua testagem em melhor situação com relação a seu próprio nível de contágio, ou seja, se manteve sob 20% de positividade. O Chile leva três semanas com mais de 20% de positividade, e na Região Metropolitana aproximadamente 1 de cada 2 testes foram positivos entre 10 e 11 de junho de acordo com os relatórios diários do MINSAL.
As universidades, laboratórios e o sistema de saúde têm feito um esforço colossal para levar a testagem diária do Chile a este grande nível. Apesar disso, não foi suficiente porque temos um processo epidêmico totalmente fora de controle. A análise do Espacio Público e da Universidad de Chile nos mostra que há demoras de semanas em reportar o resultado de um teste, o que deixa em evidência que definitivamente o sistema de testagem está totalmente colapsado. Não estamos chegando a tempo. E não estamos chegando onde devemos. Os testes continuam sendo feito “sob demanda” e, principalmente, em urgências e consultórios. Ainda não saímos para procurar o vírus, de modo que basicamente a testagem está servindo para encontrar doentes e dar-lhes tratamento, ainda que tardiamente. Mas não consegue seguir a evolução do contágio, nem realizar modelos preditivos. De fato o governo não apresentou publicamente nenhum modelo preditivo oficial para seguir o contágio no Chile, mesmo após 100 dias do primeiro caso confirmado.
Precocemente, ainda em março, o Conselho Assessor Covid-19 solicitou ao governo a publicação dos modelos preditivos usados. Também planejou medidas fortes de restrição, junto com uma estratégia agressiva de testagem e pesquisa de casos sintomáticos. As autoridades não deram atenção e o vírus tomou a capital e várias zonas do país. O perigo que enfrentamos agora se deve ao fato de que o governo insiste na baixa letalidade do vírus. Há algumas semanas advertimos sobre o perigo de confiar na taxa de letalidade e que era necessário enfatizar a testagem em nossos idosos.
Crise Hospitalar
A seguir comparamos a situação que o Chile enfrenta hoje com o vivido por países que sofreram bastante com a Covid-19, como a Espanha e a Itália, agora em franca recuperação e superado o colapso hospitalar de uma primeira onda de contágios. Na Figura 1 observamos o crescimento avassalador do contágio no Chile nas últimas semanas (curva preta). Nos acostumamos a ver comparações com outros países em escala logarítmica (algo que pode ser pouco familiar para algumas pessoas) ou dividido pela população de cada país. Este gráfico mostra os casos acumulados de Covid-19 em 12 de junho no Chile, diante de muitos países em valores absolutos. Nosso país superou em contagiados confirmados a França (com uma população 3,5 maior), a Holanda e a Austrália, que têm uma população similar a do Chile e é provável que supere a Alemanha, a Espanha e a Itália em poucos dias (três a quatro vezes a população do Chile). Como não estamos dividindo por população, observe que em números absolutos a testagem da Alemanha, Espanha e Itália foi cinco vezes maior que o Chile em 11 de junho. Simplesmente o surto está fora de controle no país. Enquanto todos os países mencionados têm uma positividade acumulada menor a 7%, o Chile tem 20%, e mais de 25% de positividade em média no mês de junho.
Há alguns dias o ministro de saúde disse: “Já não fomos a Espanha ou a Itália da América do Sul”. Sustentamos o contrário. Devido à precariedade de nosso sistema de saúde, ao montante de demandas no presente e provavelmente no futuro, enfrentamos uma crise hospitalar pior que a que atingiu os países europeus.
Desde que a pandemia foi iniciada, a maioria dos países têm reforçado seus sistemas de saúde. Entretanto, tal reforço tem um limite: o pessoal de saúde não é uma commodity que pode ser adquirida no prazo de meses. Sem uma equipe especializada ou com muitos dos enfermeiros e médicos doentes, os ventiladores mecânicos são somente bugigangas caras. Nos cálculos que apresentamos a seguir assumimos que os funcionários de saúde em cada país se relaciona com o número de camas hospitalares. Portanto, usamos as camas hospitalares como uma medida da capacidade de resposta sanitária. Para o Chile, o valor mais recente é de 2,11 camas de hospital por cada 1.000 habitantes. Ou seja, aproximadamente 40.000 camas.
Segundo dados da OECD, o sistema de saúde chileno apresenta uma ocupação de camas hospitalares próxima a 80%. Esta ocupação se calcula em base anual e pode ser maior nos meses de inverno. Por outro lado, 100% de ocupação é só um valor teórico que nunca se alcança, o colapso hospitalar é atingido antes. Com mais de 100 dias de emergência, e restando meses pela frente, é crítico que a população continue recebendo tratamento oportuno para prevenir mortes por outras causas tratáveis, por isso que não se deve dominar o sistema de saúde com a Covid-19. Aliás, em virtude da crise, na atualidade estamos deixando sem tratamento milhares de pessoas com outras doenças graves como câncer, infartos, entre outros.
A Figura 2 apresenta a resposta hospitalar que seis países deram à pandemia. Para isto, definimos a porcentagem de demanda diária por serviços de saúde (ver quadro na figura 2) considerando que no Chile cerca de 8,5% dos casos necessitaram internação. Levantando em conta que as cifras flutuam diariamente em todos os países, demonstramos essa porcentagem a partir de médias dos últimos sete dias. As porcentagens podem variar, mas em termos relativos, a situação do Chile continua sendo preocupante.
Para facilitar a compreensão do que o Chile enfrenta, o quadro mostra a evolução da doença considerando as datas no Chile. O resto dos países foi defasado temporalmente. Desta forma, todos se ajustaram ao 17 de março, quando reportavam mais de 100 casos acumulados. A curva que representa o Chile nos sugere que o nosso platô pode se parecer a um platô de altitude, com uma forma similar à da Suécia e Estados Unidos, mas com níveis de demanda hospitalar persistente a níveis muito mais altos em relação à capacidade basal do sistema. Isto é um colapso hospitalar sustentado e de grandes proporções.
A Figura 2 nos indica que a Nova Zelândia passou a parte mais grave da emergência em aproximadamente um mês. Itália, Espanha e Alemanha levaram dois meses. Tanto a Nova Zelândia como a Alemanha não superaram 0,1% de demanda hospitalar diária. A Suécia, por outro lado, não parece ter atingido um pico, alcançando logo uma redução de casos; mas parece que está em um “planalto”, com sobressaltos por mais de dois meses. O Chile tem uma demanda equivalente a mais de 1% de sua capacidade diária. Isto é mais que o dobro do que a Espanha teve em seus piores momentos.
A Nova Zelândia (que tem a metade dos habitantes da Suécia) conseguiu, em pouco mais de um mês de ação decidida e antecipada, mitigar o contágio. A estratégia resultou mais efetiva que o horror sem fim da Suécia, país que optou por não fazer quarentenas extensivas e apostou pela “imunidade de rebanho” (que não aconteceu). Se o Chile tentasse isso e cinco milhões de pessoas se contagiassem, considerando a letalidade que temos hoje (em aumento), bateríamos um mínimo de 50.000 mortos. A imunidade de rebanho acarreta uma mortalidade que carece de sustento ético. Com a estratégia de quarentenas dinâmicas, o Chile leva três meses com um crescimento contínuo da demanda hospitalar diária. Nossa situação é aterrorizadora: se comparamos com o pico de cada país, o Chile aumentou sua exigência de atendimento hospitalar a mais que o dobro da Espanha e o quádruplo da Itália e da Suécia.
A Itália e a Espanha chegaram a 0,1% de demanda hospitalar diária logo após duas e três semanas do alcance dos 100 primeiros casos. Em tais dias, ambos decretaram quarentenas totais. O Chile chegou a essa mesma exigência a meados de abril. Nesse momento tínhamos menos de 20% do país sujeito a “quarentenas dinâmicas” e realizávamos testagens cada vez mais insuficientes. Isto produziu um “achatamento” aparente dos casos durante várias semanas de abril. Segundo o site Our World in Data, o Chile fazia ao redor de 0,15 testes por mil habitantes na primeira semana de abril e aproximadamente o dobro a fins desse mês. Enquanto a Itália fazia 0,1 testes por mil habitantes (10 de março), aumentando a cinco vezes mais a fins de março e com todo o país em quarentena.
Muitos se perguntam hoje quando chegaremos ao pico do contágio. Mas isso não parece relevante pois o que estamos observando depende da capacidade de testagem. E como a testagem ficou insuficiente para um contágio fora de controle, é possível que nos enganemos com novos “platôs” ou com um “planalto”. A Suécia, por exemplo, leva cerca de dois meses em um “platô de alto contágio” provavelmente por uma testagem insuficiente. É importante entender que a testagem não é alta ou baixa em relação aos rankings internacionais, e sim em relação à expansão do contágio. No Chile, com um contágio fora de controle, poderíamos dizer que a testagem fica “exponencialmente insuficiente” a cada dia (há mais de dois meses).
O relevante a indagar é quando voltaremos a estar em uma situação de controle. A Espanha decretou quarentena total (ver Figura 2) na semana dois, ao passar de 0,1% no gráfico, e levou outras oito/nove semanas para baixar de 0,1%. A Itália superou 0,1% na semana três, e após decretar quarentena total, teve um estouro menor que a Espanha em termos de demanda hospitalar: levou sete semanas para baixar do 0,1% diário. A Espanha e a Itália (Inglaterra também) não conseguiram mitigar a pandemia com suas estratégias iniciais, portanto não tiveram outra opção além do confinamento radical.
No cenário atual o mais provável é que as vítimas fatais por dia continuem aumentando sem previsão de cessar. As pessoas que se contagiaram hoje somente serão contadas daqui a mais três semanas. Uma parte dos casos confirmados no presente se agravará e terminará em camas de UTI de sete a dez dias. As pessoas que terminam em unidades críticas estão, de modo geral, entre duas e quatro semanas nelas. Logo devem passar ao menos uma semana adicional em recuperação. Portanto, os falecidos do início de junho correspondem a pessoas que se contagiaram em meados de abril, quando o governo promovia a volta à normalidade. Com mais da metade do país fora de medidas de contenção, é difícil acreditar que antes de agosto conseguiremos liberar os hospitais e reduzir as cifras de pessoas falecidas. Gostaríamos de ter primavera.
A elite política no Chile não entendeu a gravidade da situação de emergência que vivemos. Somente considerando uma letalidade entre os casos sintomáticos de 1,5% (lembre que a “baixa letalidade do Chile é uma ilusão perigosa”) dos cerca de 35.000 novos contaminados que apareceram na primeira semana de junho, lamentaremos ao menos outros 500 falecidos por semana por várias semanas ainda. Mas esta simples previsão fica rapidamente curta ao considerar que, ainda com toda a confusão da nova contabilidade de falecidos, nos primeiros 11 dias de junho foram notificadas 1.594 pessoas falecidas, perto da espantosa cifra de 150 óbitos diários. Chegar a mais de 300 pessoas falecidas diariamente não parece distante, nem descabido.
Finalmente, a cada semana de atraso em medidas efetivas sofremos com mais de mil pessoas falecidas adicionais às que tínhamos a princípio de abril: o dobro do número de vítimas que lamentamos no terremoto e tsunami do ano de 2010, mas por cada semana O governo do chile vai muito devagar e tem resistido reiteradas vezes em avançar na direção adequada. Essa lentidão contagia, adoece, mata, empobrece, estimula uma crise social sem precedentes. A evidência sugere que um país com “quarentenas dinâmicas” por seis meses sofre mais que um país em quarentena total, como a Nova Zelândia, por um pouco mais de um mês.
Considerações finais
A informação veraz e precisa é imprescindível porque cria realidades e estimula condutas sociais que reduzem ou aumentam o contágio. Nossas colunas, como muitos relatórios de pesquisadores independentes do trabalho dos organismos oficiais, tentam escapar da contínua confusão na comunicação que tem caracterizado as declarações oficiais diárias. Muitos especialistas, incluídos #Los40delaCarta, têm consistentemente perseguido as evidências e analisado os erros de uma estratégia que em sua base é essencialmente política.
Se a pandemia oferece alto risco para todos os habitantes do Chile, ela é ainda mais penosa para grupos vulneráveis e marginalizados. Não só para as pessoas amontoadas e empobrecidas por falta de uma renda, mas também para milhares de mulheres vítimas de violência pelos seus parceiros e outros familiares; ou as pessoas sem documentos para permanecer legalmente no Chile, mas que contribuem à saúde da economia do país. A resposta ineficiente à crise, não só vem provocando impactos sanitários generalizados, como também tem intensificado as características xenófobas, racistas e machistas de nossa sociedade. Devemos admitir, com dor, que o cenário que o Chile enfrenta em Junho de 2020 é muito pior que o da Espanha, Itália ou Suécia. Se não emendamos o rumo, a pós-pandemia se parecerá às imagens traumáticas de Talcahuano depois do terremoto e tsunami de 2010, mas através de todo o país e por um longo período de tempo.
Notas
[1] Este artigo é uma versão revisada e atualizada do texto originalmente publicado em CIPER Chile em 13/06/2020, disponível neste link.
Tradução: Alexis Cortés
BACIGALUPE, Gonzalo; GONZALEZ, Rafael; CUADRADO, Cristóbal; SANDOVAL, Vicente; FARIAS, Cristian. O desastre chegou ao Chile: A falida estratégia de combate à pandemia de Covid-19. Blog DADOS, 2020 [published 23 July 2020]. Available from: http://dados.iesp.uerj.br/chile-pandemia
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